08/11/2014
70% dos deputados estão no bolso de 10 empresas
Sete de cada dez deputados federais eleitos receberam recursos de pelo
menos uma das dez empresas que mais fizeram doações eleitorais em 2014.
Os top 10 doadores contribuíram financeiramente para a eleição de 360
dos 513 deputados da nova câmara: 70%. É uma combinação inédita de
concentração e eficiência das doações por parte das contribuidoras.
Umas das principais razões para isso ter acontecido foi que, como suas
assessorias costumam dizer, as empresas não privilegiam "nenhum partido,
candidato ou corrente política". Ao contrário, elas buscam o mais amplo
espectro possível. Os 360 deputados que elas financiaram estão
distribuídos por 23 partidos diferentes.
A maior bancada é a do bife. Empresas do grupo JBS (ou que têm os mesmos
sócios) distribuíram R$ 61,2 milhões para 162 deputados eleitos. Dona
dos maiores frigoríficos do País, a JBS deu recursos para a cúpula de 21
dos 28 partidos representados na nova Câmara, incluindo todos os
grandes. As direções partidárias redistribuíram o dinheiro aos
candidatos.
A tática mostrou-se eficaz. Além de ter sido a maior doadora, a JBS
acabou elegendo a mais numerosa bancada da Câmara — mais do que o dobro
da do maior partido, o PT. Não foi a única que tentou não deixar nenhuma
sigla a descoberto.
O grupo Bradesco doou R$ 20,3 milhões para 113 deputados eleitos por 16
partidos. É a segunda maior bancada empresarial. Ficou à frente do grupo
Itaú, que contribuiu para a eleição de 84 novos deputados de 16
partidos. Mas o concorrente foi mais econômico com o dinheiro: gastou
"só" R$ 6,5 milhões. Há 42 deputados que foram financiados por ambos os
bancos. O Bradesco privilegiou as direções partidárias. O Itaú doou mais
a candidatos.
Construção
Como setor, as empreiteiras têm a maior presença entre os top 10
doadores da nova Câmara. Cinco delas entraram na lista: OAS, Andrade
Gutierrez, Odebrecht, UTC Engenharia e Queiroz Galvão.
A OAS investiu R$ 13 milhões para ajudar a eleger 79 deputados de 17
partidos — do PT ao PSDB, passando pelo PMDB e todos os grandes. Já a
Andrade Gutierrez gastou quase o mesmo valor e ajudou a eleger 68
deputados federais. A Odebrecht doou R$ 6,5 milhões para 62 deputados, a
UTC deu R$ 7,2 milhões para 61 deputados, e a Queiroz Galvão, R$ 7,5
milhões para 57 parlamentares. Mas há muitas sobreposições.
Descontando-se as doações dobradas ou triplicadas que vários novos
deputados receberam de mais de uma empreiteira, a bancada do concreto na
nova Câmara tem 214 deputados de 23 partidos. Isso não inclui
parlamentares que receberam doações de empreiteiras que não entraram nos
top 10, como C.R.Almeida.
O grupo Vale elegeu a maior bancada empresarial. Foram 85 os deputados
eleitos — de 19 partidos — que receberam uma parte dos R$ 17,7 milhões
doados pela empresa. Um deles foi o deputado reeleito pelo PP de Minas
Gerais Luiz Fernando Faria. Ele recebeu R$ 800 mil de mais de uma
empresa do grupo Vale — e já foi presidente da Comissão de Minas e
Energia da Câmara. Mas também recebeu doações de outras sete das top 10
doadoras.
Como a JBS, outra empresa voltada ao consumo popular se destacou nestas
eleições: a Ambev (dona das marcas Brahma e Antarctica, entre outras),
que doou R$ 11,7 milhões e ajudou a eleger 76 deputados de 19 partidos. A
bancada do churrasco, que recebeu do frigorífico e da cervejaria, soma
25 deputados.
Cientista político e professor do Insper, Carlos Melo qualifica tal
alcance do financiamento eleitoral por um grupo tão pequeno de empresas
de "clientelismo": "É claro que compromete o voto do deputado. Como ele
vai dizer que a doações não o influenciou?".
Conflito de interesses
Para Melo, deputados que receberam doações empresariais deveriam se
declarar impedidos de votar em matérias nas quais haja conflito de
interesse com o das empresas que o financiarama. "Como o juiz que não
julga ações em que é parte interessada. Afinal, o voto deve representar o
eleitor, não o financiador."
A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) já votou
contra a doação de empresas — mas o julgamento não terminou porque
Gilmar Mendes ainda não deu seu voto e travou a votação.
José Roberto de Toledo, Lucas de Abreu Maia e Rodrigo Burgarelli
No Estadão
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